A Água e o Perdão 
 

      Certo dia, numa batalha, uma flecha lhe atravessou a
      armadura e por pouco não lhe tirou a sua vida.
      Num relance, o cavaleiro vislumbra o paraíso, mas bem
       longe e, de qualquer maneira, fora de seu alcance.
      Vislumbra também o inferno, bem próximo dele e prestes
      a engoli-lo, porque há muito tempo se esquecera de suas
       promessas de bravo cavaleiro, tornando-se um bruto
       impenitente que matava, pilhava, violava.
      Tomado de temor salutar, tira a armadura, a espada e as
      manoplas de ferro e se dirige ao eremitério de um monge
       famoso por sua santidade.
       - Meu pai, desejo ser perdoado pelas minhas faltas,
       pois temo pela minha salvação.
       Farei a penitência que me indicares.
      - Pois bem, meu filho, vai simplesmente encher de água
      este barrilzinho e traze-mo, responde o monge.
      O cavaleiro se irrita com a proposta do eremita, mas
      o medo do inferno é mais forte, e ele põe o barril sob
      o braço e se dirige ao rio.
      Estupefato, vê o barril mergulhado na corrente
      recusar-se a encher!
      Se dirige a uma fonte que se precipita no curso d’água,
      mas o barril continua a não se encher.
      Se precipita para o poço da aldeia, mas em vão.
       Um ano depois, o velho monge vê chegar à porta de seu
       eremitério um pobre maltrapilho em farrapos, de pés
      ensangüentados e com um barril vazio debaixo do braço.
      - Meu pai, diz o cavaleiro (já que era ele), fui a todos os
      rios, fontes e lagos do pais.
      Não pude encher vosso barril.
       Agora, com certeza, não me perdoareis os pecados.
      Ai de mim! Estou perdido pelos meus pecados.
      Como me arrependo deles!
      E lágrimas lhe descem dos olhos.
      Eis que uma lágrima cai no barril.
      Num instante, este se enche até em cima, da mais
       bela água pura que a terra já viu.
      Uma única lágrima de arrependimento